sábado, 14 de maio de 2016

A IDADE MÉDIA E O RENASCIMENTO: 1050 A 1500 d.C


O período patrístico concentrou-se em torno do mundo mediterrâneo e de centros de poder como Roma e Constantinopla. A queda de Roma, ocasionada pela ação de tropas invasoras vindas do norte, lançou o mundo mediterrâneo ocidental em um completo caos. A instabilidade estendeu-se por toda a região. Os historiadores ainda se referem ao período que vai da queda de Roma até cerca do ano 1000 como a “A idade das Trevas”, uma indicação de que a cultura e o ensino eram relativamente difíceis de obter ao longo desses séculos de instabilidade e insegurança. Embora o debate teológico tenha prosseguido na igreja ocidental, ao longo desse período, enfrentava um contexto em que imperava uma mentalidade de sobrevivência. Havia um interesse relativamente reduzido em relação a esses debates teológicos. No mundo mediterrâneo oriental também surgiu uma certa instabilidade, à medida que o islamismo começou a difundir-se por toda a região. Apesar de o cristianismo jamais ter sido totalmente suplantado, muito cedo se encontrou em uma condição de minoria, em termos de religião.
Ao longo desse período da história europeia, o centro do pensamento teológico cristão deslocou-se do mundo mediterrâneo para a Europa Ocidental. Em 410, Roma foi finalmente conquistada por Alarico, um acontecimento frequentemente considerado como o início da Idade das Travas na Europa Ocidental. A expansão do islamismo pelo mundo mediterrâneo, no século VII, provocou uma instabilidade política generalizada e posteriores mudanças estruturais na região. Até o século XI, um certo grau de estabilidade havia se estabelecido nessa área, havendo surgido três grandes sistemas de poder em substituição ao antigo  Império Romano.

     1.      O Império Bizantino, cujo centro era a cidade de Constantinopla (hoje Istambul, na atual Turquia). A forma de cristianismo predominante nessa região baseava-se na língua grega e era profundamente ligada aos escritos dos estudiosos e João Damasco.

     2.      A Europa Ocidental, principalmente em regiões como a França, a Alemanha, os Países baixos e o norte da Itália. A forma de cristianismo que veio a predominar nessa região tinha como cetro a cidade de Roma e seu bispo era conhecido como “o Papa”.  (Entretanto, no período conhecido como o “Grande Cisma”, surgiu uma certa confusão: havia dois adversários que disputavam o papado, um deles baseado em Roma e o outro, na cidade de Avignon, no sul da França.) Aqui, a teologia concentrou-se na grande catedral e nas universidades de Paris e outros locais, tendo como base, em grande parte, os escritos em latim de Agostinho, Ambrósio e Hilário de Poitiers.

      3.      O Califado, região islâmica que compreende parte do Extremo Oriente e do Sul do Mediterrâneo. Com a queda de Constantinopla, em 1453, a expansão do islamismo, ao final do século XV, tinha se estabelecido de forma significativa em duas regiões do continente europeu: na Espanha e nos Balcãs. Esse avanço foi finalmente barrado pela derrota dos mouros, na Espanha, na última década do século XV, bem como pela derrota dos exércitos islâmicos fora de Viena, em 1523.

Um fato de importância fundamental na história da igreja ocorreu nesse período. Por uma série de motivos, as relações entre a igreja oriental, estabelecida em Constantinopla, e a igreja ocidental, estabelecida em Roma, tornaram-se cada vez mais hostis ao longo dos séculos IX e X. O crescente desentendimento, em torno da cláusula filioque, no credo Niceno teve grande contribuição para essa atmosfera cada vez mais hostil. Outros fatores também contribuíram, incluindo a rivalidade política entre a Roma de fala latina e a Constantinopla de língua grega, assim como a crescente pretensão de autoridade por parte do papado romano. O rompimento final entre o ocidente católico e o oriente ortodoxo é normalmente datado de 1054, embora esta data seja ligeiramente arbitrária.
Um dos maiores resultados dessa tensão foi o fato de haver uma reduzida interação teológica entre oriente e ocidente. Embora os teólogos ocidentais, como Tomás de Aquino, tenham se sentido à vontade para inspirar-se nos escritos dos pais gregos, essas obras tendem a preceder esse período. As obras de teólogos ortodoxos posteriores, como do notável escritor Gregório Palamas, atraíram pouca atenção no ocidente. Pode-se dizer que somente no século XX a teologia ocidental começou a redescobrir as riquezas da tradição ortodoxa.
O termo “teologia medieval” normalmente é usado como referência à teologia ocidental que havia nesse período, ao passo que o termo “teologia bizantina” é aproximadamente, anterior à queda de Constantinopla em 1453. Durante esse período, na história europeia ocidental os centros da teologia cristã gradualmente se transferiram para o norte, para a região central da França e da Alemanha. Embora Roma tenha permanecido como centro do poder cristão na região, a atividade intelectual gradualmente migrou para os monastérios da França, como Chartres, Reims e Bec. Com a fundação das universidades medievais, a teologia rapidamente se consolidou como uma área central de estudos acadêmicos. Uma típica universidade medieval oferecia quatro faculdades: o curso básico de humanidades e os três superiores de teologia, medicina e direito.

Esclarecimento dos termos

Definir períodos históricos é algo notoriamente complexo. Parte do problema encontra-se na falta de consenso universal em torno das características que identificam um determinado período. É especificamente isso o que ocorre com a “Idade Média”, o “Renascimento” e a “Idade Moderna”. Há também imensas dificuldades para se chegar a uma definição em relação a alguns dos movimentos intelectuais do período, especialmente o humanismo.
O período analisado nesse momento deu origem a dois dos mais importantes movimentos intelectuais do pensamento: o escolasticismo e o humanismo. Ambos dominaram o mundo intelectual – inclusive o teológico – entre 1300 e 1500. Embora se pudesse argumentar que, no ano de 1500, o escolasticismo estivesse em decadência, esse movimento ainda exercia uma grande influência sobre muitas universidades europeias, como a Universidade de Paris. Uma compreensão acerca da natureza desses movimentos é algo essencial a qualquer tentativa de entender a evolução da teologia cristã desse período ou para compreender as pressões religiosas e intelectuais, que ao final do último ser geralmente considerado como uma reação à pobreza cultural e à excessiva precisão teológica do primeiro.

A Idade Média

O termo “Idade Média” foi criado por escritores do Renascimento e pare ter sido adotado, de maneira geral, perto do final do século XVI. Os autores renascentistas ansiavam por desacreditar o período intermediário, que se instalara entre as glórias da Antiguidade clássica e sua época. Portanto, eles criaram o termo “Idade Média” como referência a uma fase monótona e estagnada, que separava dois períodos importantes e criativos. O adjetivo “medieval” significa “relacionado à Idade Média”. A expressão “teologia medieval” passou a ser de uso geral e pode, em sentido amplo, ser interpretada como “a teologia da Europa Ocidental, no período que se situa entre o final da Idade das Trevas e o século XVI”. Entretanto, essa expressão é imprecisa, contestada e possibilita vários tipos de interpretação.
Na Europa, ao fim da Idade das Trevas e o início da Idade Média, estava preparado o cenário para o reavivamento de cada área do trabalho acadêmico. Na França, ao final do século XI, a recuperação de uma certa estabilidade política, estimulou o ressurgimento da Universidade de Paris, que rapidamente se tornou conhecida como o centro intelectual da Europa. Em Paris, uma série de “escolas” teológicas foram abertas na margem esquerda do Sena e em Ile de la Cité, à sombra da recém-construída Catedral de Notre Dame.
Uma dessas escolas foi o Collège de la Sorbonne que, posteriormente, alcançou tamanha fama, tornando a expressão “a Sorbonne” uma forma abreviada de referir-se a Universidade de Paris. Já no século XVI, Paris era amplamente reconhecida como avançado centro de estudos teológicos e filosóficos, possuindo entre seus estudantes indivíduos famosos como Erasmo de Roterdã e João Calvino. Outros centros de estudos semelhantes foram logo criados em outras partes da Europa. Instaurou-se um novo programa de desenvolvimento teológico voltado à consolidação dos aspectos intelectuais, legal e espiritual da vida da igreja cristã.
A fase inicial do período medieval é dominada pelos progressos feitos na França. Vários monastérios produziram brilhantes autores e intelectuais cristãos como, por exemplo, Lanfranc (1010-89 d.C.) e Anselmo (1033-1109 d.C.), ambos oriundos do monastério de Bec, na Normandia. Rapidamente, a Universidade de Paris consolidou-se como um avanço centro de investigação teológica com estudiosos como Pedro Abelardo (1079-1142), Alberto, o Magno (1200-80), Tomás de Aquino (1225-74) e Boaventura (1217-74). Os séculos XIV e XV assistiram a uma considerável expansão do setor universitário na Europa Ocidental com a criação de importantes universidades na Alemanha e em outros locais.
Um elemento crucial para o novo interesse medieval pela teologia também está associado à Paris. Pouco antes de 1140, Pedro Lombardo chegou à universidade para dar aulas. Uma de suas principais preocupações era fazer com que seus estudantes se empenhassem para dominar os penosos temas da teologia. Como forma de contribuir para isso, ele escreveu um livro-de-texto – talvez um dos livros mais maçantes já escritos. Sua obra, Sententiarum libriquattour ou Four books of the sentences [Quatro livros de sentenças], é uma combinação de citações da Bíblia e de autores patrísticos organizados por tópicos. A tarefa que ele dava a seus estudantes era simples: encontrar os sentidos das citações e compreendê-las. O livro mostrou-se de grande relevância para o avanço do legado de Agostinho, pois os estudantes eram forçados a se empenhar para compreender as idéias de Agostinho e para conciliar textos aparentemente contraditórios por meio da elaboração de explicações teológicas adequadas sobre suas incongruências.
Alguns autores tentaram fazer com que o livro fosse censurado, destacando seus ocasionais enunciados imprudentes (como a perspectiva de que Cristo não existiu como ser humano, uma visão que veio a ser conhecida como “niilismo cristológico”). Entretanto, até 1215, a obra havia se firmado como livro-de-texto mais importante da época. O estudo e o comentário da obra de Pedro Lombardo tornaram-se obrigatórios para os teólogos. O trabalho resultante tornou-se um dos mais conhecidos gêneros literários da teologia na Idade Média. Entre os mais notáveis exemplos incluem-se os comentários de Tomás de Aquino, Boaventura e Duns Scotus.


O Renascimento

O termo, derivado da palavra francesa “renaissance”, é hoje empregado universalmente para designar o avivamento literário e artístico que ocorreu na Itália dos séculos XIV e XV. Paolo Giovio, em 1546, referiu-se ao século XIV como “aquele afortunado século, em que as letras latinas renasceram (renatae)”, de certa forma antecipando a nomenclatura dada ao período. Certos historiadores, especialmente Jacob Burckhardt, alegam que o Renascimento deu origem à Idade Moderna. De acordo com Burckhardt, foi nesse período que o ser humano começou a pensar sobre si mesmo como indivíduo. A definição de Burckhardt, sob vários aspectos, explica o Renascimento em termos puramente individualistas, o que é altamente questionável. No entanto, ele está indubitavelmente correto em um sentido: algo de novo e empolgante ocorreu na Itália renascentista que se mostrou capaz de exercer um grande fascínio sobre várias gerações de intelectuais.
Não fica inteiramente claro o motivo pelo qual a Itália veio a tornar-se o berço desse novo e brilhante movimento na história das ideias. Diversos fatores foram identificados como detentores de certa influência nessa questão.

    1.      A teologia escolástica – a mais importante força intelectual do período medieval – jamais teve particular influência na Itália. Embora muitos italianos tenham sido famosos teólogos (inclusive Tomás de Aquino e Gregório de Rimini), eles geralmente viviam e trabalhavam no norte da Europa. Portanto, havia um vácuo intelectual na Itália ao longo do século XIV. Espaços vizinhos tendem a ser ocupados – e o humanismo renascentista empenhou-se para ocupar essa brecha em particular.

      2.      A Itália estava repleta de visíveis e tangíveis resquícios de grandeza da Antiguidade. As ruínas de antigos monumentos e construções romanas espalhavam-se por todo o país e parecem haver despertado, na época do Renascimento, o interesse pela antiga civilização romana, atuando como estímulo para que seus intelectuais resgatassem a vitalidade da cultura clássico-romana, em uma época que era culturalmente árida e estéril.

     3.      À medida que teve início a decadência do Império Bizantino – Constantinopla caiu, finalmente, em 1453 – ocorreu um êxodo de intelectuais de fala grega em direção ao ocidente. A Itália, por mero acaso, ficava convenientemente perto de Constantinopla, resultando no fato de que muitos desses imigrantes estabeleceram-se em cidades da Itália. Um avivamento de língua grega foi, portanto, inevitável e, juntamente com ele, uma retomada do interesse pelos clássicos gregos.

Ficará bastante evidente que um componente central da cosmovisão do Renascimento italiano é um retorno ao esplendor cultural da Antiguidade e uma marginalização das conquistas intelectuais da Idade Média. Escritores renascentistas tinham pouco respeito em relação a essas conquistas, considerando que as grandes conquistas da Antiguidade eram superiores às da Idade Média. O que era válido para a cultura em geral, também era em relação à teologia: considerava-se o antigo período clássico como algo que ofuscou totalmente a produção teológica da Idade Média, tanto em conteúdo quanto em estilo. Na verdade, o Renascimento pode ser parcialmente visto como uma reação contra o tipo de abordagem progressivamente associado às faculdades de humanidades e teologia, das universidades do norte da Europa. Irritados pela natureza técnica da linguagem e dos debates escolásticos, os escritores do Renascimento os deixaram totalmente em um engajamento direto com o texto das Escrituras e com os escritos do período patrístico.

O Escolasticismo

O escolasticismo é provavelmente um dos movimentos intelectuais mais desprezados na história da humanidade. Seu nome é derivado das grandes scholae (“escolas”) medievais, nas quais se debatiam questões de teologia e filosofia, frequentemente com tamanha complexidade que tem surpreendido bem como divertido aos historiadores posteriores. A palavra inglesa “dunce” (cheio) deriva-se de um dos maiores escritores escolásticos, Duns Scotus. Os pensadores escolásticos – os “escolásticos” – são frequentemente retratados a debater com grande seriedade, ainda que inutilmente, a respeito de quantos anjos poderiam dançar na cabeça de um alfinete. Embora esse debate em particular nunca, na verdade, tenha ocorrido, mesmo considerando-se que seu resultado teria sido, inquestionavelmente, intrigante, ele resume com precisão a maneira como o escolasticismo era considerado pela maioria das pessoas, especialmente os humanistas, no início do século XVI: uma inútil e árida especulação intelectual a respeito de trivialidades. Erasmo de Roterdã passou alguns meses, perto do final do século XV, na Universidade de Paris, dominada pelo escolasticismo. Ele escreveu extensamente a respeito de muitas coisas de Paris que detestou: os piolhos, a comida escassa, as latrinas fétidas e os debates absolutamente tediosos que angustiavam os escolásticos. Deus poderia se tornar um pepino, em vez de homem? Ou poderia Deus desfazer o passado, por exemplo, fazendo com que uma prostituta se tornasse virgem? Se havia seriedade por trás desses detrás desses debates, o sarcasmo de Erasmo de Roterdã desviou a atenção das questões em si para a maneira frívola e ridícula em que eram discutidas.
Pode-se alegar que o próprio termo “escolasticismo” foi inventado por escritores humanistas que ansiavam por desacreditar o movimento por ela representado. Já observamos que a expressão “Idade Média” foi, em grande parte, uma criação humanista cunhada por escritores humanistas do século XVI, em referência pejorativa a um insípido período de estagnação, situado entre a Antiguidade (o período clássico) e a Modernidade (o Renascimento). A Idade Média é vista como nada mais do que um intermezzo entre o esplendor cultural da Antiguidade e seu ressurgimento, o Renascimento. Da mesma forma, o termo “escolástico” (scholastici) era empregado pelos humanistas em referência, igualmente pejorativa às ideias da Idade Média. Em sua preocupação de desacreditar as ideias do período medieval, com a finalidade de aumentar os atrativos do período clássico, os humanistas se interessavam em traçar diferenças entre os diversos tipos de “escolásticos” – como os tomistas e os seguidores de Duns Scotus. Portanto, a palavra “escolasticismo” é ao mesmo tempo pejorativa e imprecisa – contudo, o historiador não pode deixar de usá-la.
Como podemos definir o escolasticismo? Da mesma forma que ocorre com muitos outros termos culturais importantes como “humanismo” e “iluminismo”, é difícil oferecer uma definição exata que faça justiça a todas as distintas posições das maiores escolas ao longo da Idade Média. Talvez, a seguinte definição prática possa ser útil: o escolasticismo é mais conhecido como movimento medieval, surgido em 1250 a 1500, que enfatizou a justificação racional da crença religiosa bem como a apresentação dessas crenças de forma sistemática. Logo, o termo “escolasticismo” não se refere a um sistema específico de crenças, mas a um modo particular de se produzir e sistematizar a teologia. Talvez seja compreensível porque, sob a ótica de seus críticos humanistas, o escolasticismo pareceu degenerar-se em nada mais do que uma lógica concentrada em detalhes pequenos e sem importância.
Entretanto, o escolasticismo fez contribuições importantes para áreas fundamentais da teologia cristã, especialmente em relação à discussão sobre o papel da razão e da lógica na teologia. Os escritos de Tomás de Aquino, Duns Scotus e Occam- frequentemente destacados como os três mais influentes autores escolásticos – contribuíram de forma impressionante para o desenvolvimento dessa área da teologia, sendo, desde essa época, considerados como marcos.
Afinal, que tipos de escolasticismos existiam? Assim como acontece com o “humanismo”, o termo “escolasticismo” define uma abordagem ou um método, em vez de um conjunto de doutrinas específicas resultantes da aplicação desse método. Portanto, há vários tipos de escolasticismos. Esta parte do capítulo irá investigar brevemente algumas de suas principais correntes ou “escolas”, conferindo particular atenção àquelas que foram relevantes, no período medieval, para o desenvolvimento teológico. Começaremos por traçar a diferenciação entre “realismo” e “nominalismo”, duas teorias do conhecimento bastante divergentes que tiveram um impacto decisivo no desenvolvimento do escolasticismo.

O realismo e o nominalismo

A diferenciação entre o realismo e o nominalismo possui uma grande importância considerável para a compreensão da teologia medieval, o que nos obriga, portanto, a analisa-la de forma mais detalhada. A fase inicial do período escolástico (c. 1200 – c. 1350) foi dominada pelo realismo, embora sua fase final (c. 1350 – c. 1500) o nominalismo fosse predominante. A diferença entre as duas correntes pode ser descrita da seguinte forma. Considera duas pedras brancas. O realismo afirma que há um conceito universal de “brancura” que essas duas pedras incorporam. Essas duas pedras brancas, em particular, possuem a característica da “brancura”. Embora as pedras as pedras brancas existam no tempo e no espaço, o conceito universal de “brancura” existe em um plano metafísico distinto. O nominalismo, porém, afirma que devemos nos concentrar em particulares. Essas duas pedras brancas existem – e não há qualquer necessidade de apelar para algum “conceito universal de brancura”.
A ideia “universal”, aqui utilizada sem qualquer definição, precisa ser melhor analisada. Pense em Sócrates. Ele é um ser humano e, portanto, um exemplo de humanidade. Agora pense em Platão e Aristóteles. Da mesma forma, são seres humanos e exemplos de humanidade. Poderíamos continuar fazendo esse tipo de raciocínio indefinidamente, nomeando quantos indivíduos desejássemos, porém, o mesmo padrão básico sempre aparece; os indivíduos – como Sócrates, Platão e Aristóteles – são exemplos particulares desse conceito universal. A característica comum da humanidade, que une esses três indivíduos, possui existência autônoma e real.
Duas grandes “escolas” desse movimento, que sofreram a influência do realismo, dominaram o início do período medieval. São elas o Tomismo e o Scotismo, no entanto, o final do escolasticismo foi dominado por outras duas grandes escolas, ambas comprometidas com o nominalismo, e não com o realismo. Geralmente são conhecidas como o “caminho moderno” (via moderna) e a “escola Agostiniana moderna” (schola Augustiniana moderna).

O caminho moderno

O termo via moderna – o “caminho moderno” – vem sendo atualmente aceito como a melhor maneira de referir-se ao movimento uma vez conhecido como “nominalismo”, o qual incluía entre seus adeptos intelectuais dos séculos XIV e XV, figuras como Guilherme de Occam, Pierre d’ Ailly, Robert Holcot e Gabriel Biel. Ao longo do século XV, o “caminho moderno” iniciou incursões significativas em muitas das universidades do norte da Europa – por exemplo, em Paris, Heidelberg e Erfurt. Além de sua filosofia nominalista, o movimento adotava uma doutrina da justificação que muitos de seus críticos rotularam como pelagiana. Em oposição a esse contexto, define-se a origem da teologia de Martinho Lutero.

A escola agostiniana moderna

No início do século XIV, um dos bastiões do “caminho moderno” foi a Universidade de Oxford. Foi também neste local que ocorreu a primeira reação negativa relevante contra o movimento. Thomas Bradwardine, que posteriormente tornou-se o Arcebispo de Cantuária, foi o responsável por essa reação. Bradwardine escreveu um livro, intitulado The case of God against Pelagius [A defesa de Deus contra Plágio], atacando de forma veemente as ideias do “caminho moderno” de Oxford. Nessa obra, ele desenvolveu uma teoria sobre a justificação que representava um retorno às expectativas de Agostinho de Hipona, encontradas em seus últimos escritos antipelagianos.
As ideias de Bradwardine seriam desenvolvidas na Inglaterra por John Wycliffe. Porém, a Guerra dos Cem Anos, de 1337 a 1453, levou a Inglaterra a um progressivo isolamento em relação ao continente europeu. As radicais ideias agostinianas associadas a Bradwardine foram adotadas no continente europeu por Gregório de Rimini, na Universidade de Paris. Ele tinha uma vantagem particularmente significativa sobre Bradwardine: Gregório era membro de uma ordem religiosa (a Ordem dos Monges Eremitas de Santo Agostinho, geralmente chamada de “Ordem dos Agostinianos”). E, da mesma forma que os monges dominicanos difundiram as perspectivas de Tomás de Aquino e os franciscanos as ideias de Duns Scotus, também os agostinianos promoveram as ideias de Gregório de Rimini. Essa transmissão da tradição agostiniana no seio da Ordem dos agostinianos, derivada de Gregório de Rimini, é progressivamente chamada de schola Augustiniana moderna ou “escola Agostiniana Moderna”. Que ideias foram essas?
Primeiro, Gregório adotou a postura nominalista na questão de regras universais. Como muitos intelectuais de seu tempo, ele tinha pouca simpatia pelo realismo de Tomás de Aquino ou de Duns Scotus. Nesse aspecto, ele tinha muito em comum com intelectuais do “caminho moderno” como Robert Holcot e Gabriel Biel. Segundo, Gregório desenvolveu uma soteriologia ou doutrina da salvação, que retratava as ideias características de Agostinho. Por exemplo, podemos perceber a ênfase em relação à necessidade da graça, a condição da decadência e pecado da humanidade, à iniciativa de Deus na justificação, bem como em relação à predestinação divina. A salvação é vista como obra exclusivamente divina, do início ao fim. Enquanto os adeptos do “caminho moderno” alegavam que os seres humanos poderiam iniciar sua justificação ao “dar o melhor de si”, Gregório insistia que somente Deus poderia desencadear o processo de justificação.
O “caminho moderno” defendia que a maior parte dos recursos necessários (mas nem todos) para a salvação eram inerentes à natureza humana. As virtudes de Cristo são exemplo de recursos que se encontram fora da natureza humana; a capacidade de resistir ao pecado e voltar-se para a virtude representa, para um escritor como Biel, um vivo exemplo de um recurso soteriológico que se encontra na própria natureza humana. Em clara oposição, Gregório de Rimini alegava que esses meios encontravam-se exclusivamente fora da natureza. Em clara oposição, Gregório de Rimi alegava que esses meios encontravam-se exclusivamente fora da natureza humana. Mesmo a capacidade de renunciar ao pecado e voltar-se para a virtude surgia por meio da ação de Deus e, não do ser humano.
É evidente que essas duas abordagens representam duas formas completamente distintas de entendimento do papel de Deus e do homem na justificação. Embora o agostianismo acadêmico de Gregório fosse particularmente associado à Ordem dos Agostinianos, nem todo monastério ou toda universidade filiados a essa ordem parece haver adotado suas ideias. No entanto, parece que, ao final da Idade Média e na iminência da Reforma, havia uma corrente de pensamento cujo caráter era bastante agostiniano. De muitos modos, os reformadores de Wittenberg, com sua particular ênfase sobre os escritos antipelagianos de Agostinho, podem ser considerados como aqueles que redescobriram e revitalizaram essa tradição.

O humanismo

Atualmente, o termo “humanismo” passou a significar uma cosmovisão que nega a existência ou a importância de Deus, ou seja, voltada a uma perspectiva exclusivamente secular. Não era o significado da palavra na época do Renascimento. A maioria dos humanistas daquele período era religiosa e preocupada com a purificação e a renovação do cristianismo, não com sua abolição. O termo “humanismo” acaba sendo, na verdade, um tanto difícil de ser definido. Em um passado recente, duas importantes linhas de interpretação desse movimento predominavam. Conforme a ótica da primeira linha, o humanismo foi um movimento voltado ao estudo de línguas e literatura clássica; de acordo com a segunda, o humanismo foi basicamente um conjunto de ideias que encerrava a nova filosofia do Renascimento.
Como ficará evidente, ambas as interpretações do humanismo apresentam sérias deficiências. Por exemplo, é inquestionável o fato de que o Renascimento assistiu o avanço do conhecimento clássico. Por toda parte, estudava-se os clássicos gregos e latinos em suas versões originais. Portanto, pode parecer que o humanismo foi essencialmente um movimento acadêmico voltado ao estudo do período clássico. Isso, porém, significa negligenciar a questão do motivo pelo qual os humanistas desejavam, em primeiro lugar, estudar os clássicos. A evidência disponível, sem dúvida, indica que esse estudo era considerado um meio voltado a um fim e não um fim em si mesmo. Esse fim era promover a eloquência na escrita e na oratória da época. Em outras palavras, os humanistas estudaram os clássicos como modelos de eloquência escrita, com a finalidade de adquirir inspiração e instrução. O aprendizado clássico e a competência filosófica eram simplesmente ferramentas utilizadas na exploração dos recursos da Antiguidade. Como é apontado com frequência, os escritos humanistas dedicados a incentivar a eloquência, tanto na escrita quanto na oratória, excedem, em muito, àqueles voltados ao conhecimento clássico e à filosofia.
De acordo com vários outros intérpretes do humanismo do século XX, o movimento incorporou a nova filosofia do Renascimento, que surgiu em reação ao escolasticismo. Logo, argumenta-se que o Renascimento foi um era platônica, ao passo que o escolasticismo foi um período aristotélico. Outros ainda alegaram que o Renascimento foi um fenômeno essencialmente contrário à religião, em antecipação ao secularismo do movimento iluminista do século XVIII.
A ambiciosa pretensão de interpretar o humanismo é confrontada por duas dificuldades fundamentais. Primeiro como vimos, o interesse primordial dos humanistas parece ser voltado ao incentivo da eloquência. Embora não seja verdadeira a afirmação de que os humanistas não deram uma contribuição significativa no campo da filosofia, permanece o fato de que se interessavam, acima de tudo, pelo mundo das letras. Logo, em comparação com as obras dedicadas à “busca da eloquência” há uma quantidade extraordinariamente reduzida de obras humanistas voltadas à filosofia. Aquelas que efetivamente tratam deste tema geralmente mostram-se um tanto amadorísticas.
Em segundo lugar, intensos estudos das obras humanistas revelaram um fato perturbador, que aponta para o caráter incrivelmente heterogêneo do “humanismo”. Muitos escritores humanistas, por exemplo, eram adeptos de Platão –, mas outros preferiram Aristóteles. Alguns humanistas italianos exibiam atitudes que pareciam ser anti-religiosas –, mas outros eram profundamente piedosos. Alguns humanistas eram republicanos – outros, porém, adotavam posições políticas diversas. Estudos recentes também têm chamado à atenção para o lado menos atraente do humanismo – a obsessão de alguns humanistas pela mágica e superstição – o que, talvez, seja difícil de harmonizar com a visão tradicional do movimento, em uma antecipação do racionalismo inerente ao movimento iluminista. Em síntese, para os estudiosos, tornou-se cada vez mais evidente que o humanismo aparentemente não possuía qualquer filosofia coerente. Não há uma ideia, filosófica ou política, que tenha dominado ou caracterizado o movimento. Pareceu a muitos que o termo “humanismo” poderia ser corado do vocabulário dos historiadores, pois não apresentava qualquer conteúdo significativo. Designar um escritor como “humanista” não significava, na verdade, transmitir qualquer informação que fosse essencial em relação a suas posturas filosófica, política ou religiosa.
Uma abordagem mais realista, que conquistou ampla aceitação nos círculos acadêmicos, é a visão do humanismo como um movimento cultural e educacional, interessado, sobretudo, em promover a eloquência em suas mais diversas formas. Seu interesse em relação à ética, à filosofia e à política são de importância secundária. Ser humanista significa, acima de tudo preocupar-se em promover a eloquência, deixando as demais questões em segundo plano.
Portanto, o humanismo é essencialmente um projeto cultural que recorria à Antiguidade Clássica como modelo de eloquência. O importante era o retorno ad fontes (o retorno “às fontes”). Esse lema latino implementou a visão do retorno da cultura moderna ocidental às fontes da Antiguidades, permitindo que suas ideias e seus valores revigorasse e renovassem aquela cultura. O período clássico deveria ser tanto um meio quanto uma regra para o Renascimento. Em relação às artes e à arquitetura, assim como em relação à palavra falada ou escrita, a Antiguidade era vista como um recurso cultural do qual o Renascimento poderia se apropriar. Logo, o humanismo estava interessado em como as ideias eram adquiridas e expressadas e não com a verdadeira substância dessas ideias. O humanista poderia ser adepto de Platão e Aristóteles – porém, em ambos os casos, as ideias envolvidas eram provenientes da Antiguidade. O humanista poderia ser um cético ou um crédulo – no entanto, ambas as posturas poderiam ser defendidas a partir da Antiguidade.

O humanismo do norte da Europa

Em termos teológicos, a forma de humanismo que provou ser particularmente importante é, sobretudo, o humanismo do norte da Europa, em vez do humanismo italiano. Portanto, devemos considerar que forma esse movimento assumiu no norte da Europa.
Torna-se cada vez mais evidente que o humanismo italiano teve influência decisiva sobre o humanismo do norte da Europa em cada estágio de seu desenvolvimento. No norte da Europa, foram identificados três canais principais da difusão dos métodos e ideais da Renascença italiana:

     1.      Por meio dos acadêmicos do norte da Europa que mudaram para o sul, na Itália, talvez para estudar em uma universidade italiana ou como parte de uma missão diplomática. Ao retornar para sua terra natal, eles trouxeram o espírito da Renascença com eles.

     2.      Por meio da correspondência dos humanistas italianos. O humanismo preocupava-se em promover a eloquência por intermédio da escrita, e o escrever cartas era visto como uma maneira de incorporar e difundir as ideias da Renascença. O volume da correspondência dos humanistas italianos com o exterior era considerável, estendendo-se à maioria das regiões do norte da Europa.

     3.      Por meio da impressão de livros que se originavam de fontes como a editora Aldine, em Veneza. Essas obras eram reimpressas por editoras do norte da Europa, particularmente em Basiléia, na Suíça. Humanistas italianos normalmente dedicavam suas obras a patrocinadores do norte da Europa, assegurando, assim, que elas seriam notadas nos círculos de maior influência.
Embora, existam três grandes variações no seio do humanismo do norte da Europa, dois ideais parecem haver alcançado ampla aceitação em todo o movimento. Primeiro, havia a preocupação comum em relação à eloquência na escrita e na oratória, seguindo do estilo do período clássico, assim como na Reforma italiana. Segundo, percebemos um projeto religioso voltado ao avivamento de toda a igreja cristã. O lema latino Christianismus renascens, que significa “o renascimento do cristianismo”, sintetiza os objetos desse projeto e mostra sua relação com o “renascimento” das letras, associado à Renascença.
Tendo em vista a importância do humanismo para a Reforma na Europa, analisaremos algumas de suas variantes locais, particularmente em relação à Suíça, França e Inglaterra.

O humanismo suíço

A Suíça talvez em decorrência de sua posição geográfica mostrou-se particularmente receptiva às ideias do Renascimento italiano. A Universidade de Viena atraía grande número de estudantes que vinham dessa região. Nos últimos anos do século XV, um golpe na faculdade de letras clássicas de Viena, em grande parte planejado por influência de Konrad Celtis, assegurou que Viena se tornasse um centro de aprendizado humanista, atraindo indivíduos como o grande escritor humanista Joachim von Watt, cujo pseudônimo era Vadian. Ele, após conquistar, em Viena, todas as honras acadêmicas possíveis, regressou a sua cidade natal de St Gallen, tornou-se líder dos cidadãos (burgomestre), em 1529. A Universidade de Basiléia também alcançou reputação semelhante na década de 1510 e tornou-se o núcleo de um grupo humanista (normalmente, chamado de “irmandade”), que se concentrava em torno de indivíduos como Thomas Wyttenbach.
O humanismo suíço tem sido objeto de intensos estudos e seu caráter básico é razoavelmente bem compreendido. O cristianismo, sob sua ótica, era considerado, acima de tudo, um estilo de vida, em vez de um conjunto de doutrinas. A reforma era, de fato, necessária, porém, estava vinculada, sobretudo, à moralidade da igreja e à necessidade de renovação moral pessoal de cada fiel. No humanismo suíço, não havia qualquer pressão no sentido de reforma doutrinária da igreja.
O caráter do humanismo suíço era intensamente moralista e considerava as Escrituras como algo que prescrevia a correta conduta moral para os cristãos e não o relato das promessas de Deus. Esse caráter apresentava uma série de implicações relevantes, em especial em relação à doutrina da justificação. Em primeiro lugar, as questões que estimularam o interesse de Martinho Lutero por essa doutrina que estavam significativamente ausentes nos círculos suíços. A justificação era algo que não despertava polêmicas. De fato, os humanistas suíços tinham receio das perspectivas de Martinho Lutero sobre a justificação, que pareciam representar uma ameaça radical à moralidade e, portanto, ao caráter distintivo de seu movimento.
A importância dessas observações está relacionada à figura de Ulrico Zuínglio, que estudou nas universidades de Viena (1498-1502) e da Basiléia (1502-1506). O programa de Reforma de Zuínglio, em Zurique, iniciado em 1519, carrega as marcas da moralidade do humanismo suíço. Agostinho, o “doutor da graça”, parece não ter papel importante no pensamento de Zuínglio, até a década de 1520 (e, mesmo depois, sua influência está relacionada principalmente à perspectiva de Zuínglio acerca dos sacramentos). Zuínglio finalmente rompeu com o moralismo do movimento humanista suíço (provavelmente, por volta de 1523, mas, com certeza, em 1525 já havia rompido), porém, até esse momento, seu programa de reforma baseava-se na perspectiva educacional moralista, tão característica das fraternidades humanistas da Suíça, pertencentes a esse período.

O humanismo francês

Na França, do século XVI, o estudo de Direito passava por um processo de radical revisão. A monarquia absolutista francesa, sob a liderança de Francisco I, com sua crescente tendência em direção à centralização administrativa, considerava a reforma legal como algo essencial para a modernização da França. Francisco I, com vistas a acelerar o processo de reforma legal, que levaria posteriormente à formulação de um sistema legal válido para toda a França, deu apoio estratégico a um grupo de acadêmicos, que se encontrava nas universidades de Bourges e Orleans e que estava envolvido com os aspectos teóricos dos códigos legais genéricos, fundamentados em princípios universais. Guillaume Budé, um pioneiro dentre estes, defendia o retorno direto ao Direito romano, como um meio, ao mesmo tempo expressivo e econômico, de responder às novas necessidades legais da França. Em oposição ao costume italiano (mos italicus) de interpretar textos legais clássicos à luz das glosas e comentários dos juristas medievais, os franceses desenvolveram um procedimento (mos gallicus) que recorria diretamente às fontes legais clássicas originais, em seu idioma original.
Uma das consequências da proposta humanista de operar diretamente ad fontes era a manifesta impaciência com glosas (anotações sobre o texto) e comentários. Esses recursos, longe de ser vistos como ferramentas úteis ao estudo, esses recursos passaram, progressivamente, a ser considerados como obstáculos ao envolvimento com o texto original. Escritores como como Bartholus e Accursius, passaram a considerar como irrelevantes as interpretações dos textos legais do classicismo romano. Funcionavam como filtros, entre o leitor e o texto, provocando distorções. À medida que a nova pesquisa acadêmica tornou-se mais confiante em suas declarações, a credibilidade de Accursius e dos demais era cada vez mais questionadas pelos humanistas. Antonio Nebrija, grande acadêmico espanhol, publicou uma detalhada descrição dos erros que havia detectado nas glosas de Accursius, ao passo que Rabelais escreveu, desonestamente, acerca das “opiniões ineptas de Accursius”.
Deve-se destacar a importância do avanço em relação à reforma. João Calvino, o futuro reformador, estudo em Bourges e Orleans, tendo chegado a Orleans provavelmente em 1528, no auge do humanismo jurídico francês. João Calvino, estudando Direito civil em Orleans e Bourges, veio a ter contato direto com um célebre adepto do movimento humanista. Esse encontro, no mínimo, fez chamado para auxiliar na codificação das “leis e éditos” de Genebra, João Calvino foi capaz de utilizar seu conhecimento sobre o sistema de Direito romano civil clássico (Corpous Iuris Civilis) para modelos de contratos, direito patrimonial e procedimento judiciário. João Calvino, porém, aprendeu muito mais com o humanismo francês.
É plausível alegar que a origem do método de João Calvino, talvez o maior comentarista bíblico e pregador de sua época, esteja em seu estudo de Direito na sofisticada atmosfera de Orleans e Bourges. Há várias indicações de que ele aprendeu com Budé sobre a necessidade de ser um competente filólogo, de fazer uma aproximação direta a um texto básico, de interpretá-lo de acordo com os parâmetros linguísticos e históricos de seu contexto e de aplica-lo as necessidades da época atual. É exatamente essa atitude que dá sustentação à exposição de João Calvino em relação às Escrituras, em especial em seus sermões, nos quais objetiva unir os horizontes das Escrituras ao contexto de sua audiência. O humanista francês forneceu a João Calvino tanto o incentivo como os instrumentos que tornaram possível a interação entre os documentos do passado e a situação da cidade de Genebra nos anos de 1550.

O humanismo inglês

A Universidade de Cambridge, na Inglaterra do início do século XVI, era provavelmente o centro humanista mais importante, embora a importância das universidades de Oxford e de Londres não deva ser subestimadas. Cambridge foi o local onde se deu o início da Reforma da Inglaterra, cujo centro ficava na “White Horse Circle” [Círculo do cavalo branco] (nome dado por causa de uma taverna, hoje demolida, que ficava perto do Queen’s College), em que indivíduos como Robert Barnes, no início da década de 1520, se reuniam para ler e debater os escritos mais recentes de Martinho Lutero. Era possível que a taverna logo recebesse o apelido de “pequena Alemanha”, assim como no futuro, o local da King Street, em Cambridge – que já foi a sede do Partido Comunista de Cambridge – seria conhecido como a “pequena Moscou”, na década de 1930.

Teólogos fundamentais

Dos diversos teólogos importantes que surgiram nesse período de intensa criatividade, os que se seguem são de interesse e importância especiais.

Anselmo da Cantuária (c. 1033 – 1109)

Anselmo de Cantuária nasceu no norte da Itália, mas logo mudou-se para a França, que ganhava fama como um centro de estudos. Rapidamente, ele aprendeu a lógica e a gramática, conquistando uma excelente reputação como professor na abadia de Norman, em Bec. Anselmo, havendo vivido no início do renascimento teológico do século XII, contribuiu de forma decisiva para o debate em duas áreas: as provas da existência de Deus e a interpretação racional da morte de Cristo na cruz. A obra Proslogion (a palavra é praticamente impossível de se traduzir) foi escrita por volta de 1079. É uma obra notável, na qual Anselmo se propõe a incumbência de formular um argumento que levaria à crença na existência e no caráter de Deus como o bem supremo. A análise resultante, normalmente conhecida como “argumento ontológico”, levou à dedução da existência de Deus a partir da afirmação de que Ele era “aquele sobre quem nada maior pode ser concebido”. Embora o raciocínio tenha sido contestado desde sua concepção, ainda é considerado um dos componentes mais intrigantes da filosofia teológica. A obra Proslogion também é relevante devido à seu nítido apelo à razão em questões teológicas, assim como por valorizar o papel da lógica. De muitas maneiras, a obra antecipa os melhores aspectos da teologia escolástica. A expressão de Anselmo fides quaerens intellectum (“a fé em busca do conhecimento”) passou a ser de uso geral.
Anselmo, após a invasão da Inglaterra pelos normandos (1066), foi convidado a assumir a função de Arcebispo de Cantuária, em 1093, assegurando, portanto, o fortalecimento da influência normanda sobre a igreja da Inglaterra. Essa não foi um fase propriamente feliz de sua vida, devido a uma série de violentas disputas de terras entre a igreja e a monarquia. Anselmo, em um período que passou trabalhando na Itália, escreveu Cur Deus homo [Porque Deus homem], talvez sua obra mais importante. Anselmo, nessa obra, busca estabelecer uma demonstração racional da necessidade de Deus em se tornar homem, assim como uma análise dos benefícios resultantes à humanidade, em consequência da encarnação e da obediência do Filho de Deus. Esse argumento, continua a ter importância fundamental para qualquer discussão acerca das “teorias da expiação” – que representam, em outras palavras, perspectivas acerca do significado da morte e ressurreição de Cristo, bem como de sua importância para a humanidade. Essa obra exibe características típicas do que há de melhor no escolasticismo: o apelo à razão, a ordenação lógica dos argumentos, a investigação incansável acerca das implicações dos conceitos e a convicção fundamental de que, no íntimo, o evangelho cristão é racional e pode ser apresentado dessa forma.

Tomás de Aquino (c. 1225 – 74)

Tomás de Aquino nasceu no castelo de Roccasecca, na Itália, e era filho mais novo do Conde Landolfo de Aquino. A julgar por seu apelido – “boi quieto” – ele era bastante corpulento. Tomás de Aquino, em 1244, ainda no final de sua adolescência, decidiu unir-se à ordem dos Dominicanos – também conhecida como a “Ordem dos Pregadores”. Seus pais se opunham a isso: eles teriam preferido que Tomás de Aquino se tornasse um beneditino e, talvez, chegasse a ser prior de Monte Cassino, uma das funções de maior prestígio na igreja medieval. Seus irmãos o mantiveram aprisionado, durante um ano, em um dos castelos da família, para encorajá-lo a mudar de ideia. Aquino, apesar da intensa oposição de sua família, por fim conseguiu fazer o que queria e tornou-se um dos mais célebres intelectuais religiosos da Idade Média. Conta-se que um de seus professores disse: “Um dia o mugido desse boi será ouvido em todo o mundo”.
Aquino iniciou seus estudos em Paris, antes de mudar para Colônia, em 1248. Em 1252, regressou para Paris para estudar teologia. Quatro anos depois, conseguiu permissão para lecionar teologia na universidade. Aquino, ao longo dos quatros anos seguintes, ensinou o evangelho de Mateus e começou a escrever a Summa contra gentiles [Suma contra os gentios]. Aquino, nessa grande obra, forneceu grandes argumentos em defesa da fé cristã, para benefício dos missionários que trabalhavam entre muçulmanos e judeus. Em 1266, deu início a sua obra mais famosa, Summa theologiae [Suma Teológica], normalmente conhecida pelo título em latim. Ele, nessa obra, desenvolveu um estudo detalhado sobre aspectos fundamentais da teologia cristã (como o papel da razão em relação à fé), bem como faz uma análise minuciosa de questões doutrinárias essenciais (como a questão sobre a divindade de Cristo). A obra divide-se em três partes, sendo a segunda parte subdividida em outras duas. A Parte I, trata-se essencialmente de Deus, o Criador; a Parte II – que se subdivide em duas seções conhecidas como prima secundae e secunda secundae (literalmente, a “primeira parte da segunda” e a “segunda parte da segunda”) –, trata da reconciliação da humanidade com Deus; e a Parte III, trata da maneira pela qual a pessoa e a obra de Cristo trazem salvação para a humanidade.
Aquino, em 6 de dezembro de 1273, declarou que não poderia mais escrever. Ele disse: “Tudo que escrevi, parece-me insignificante”. É provável que ele tenha tido algum tipo de colapso, causado talvez pelo excesso de trabalho. Ele morreu em 7 de março de 1274. Dentre as contribuições fundamentas que Aquino fez à teologia, as seguintes possuem importância especial:

·         As Cinco vias (argumentos em favor da existência de Deus);
·         O princípio da analogia, que fornece uma base teológica para o conhecimento de Deus por meio da criação;
·         A relação entre a fé e a razão.

Duns Scotus (c. 1265 – 1308)

Dun Scotus foi, sem dúvida, uma das mentes mais brilhantes da Idade Média. Em seus poucos anos de vida foi professor em Cambridge, Oxford e Paris, bem como produziu três versões de Commentary on the sentences [Comentário às sentenças]. Conhecido como “doutor das sutilezas”, devido às distinções bastante sutis que frequentemente traçava entre os possíveis significados dos termos, foi responsável por uma série de avanços de considerável importância para a teologia cristã. Somente três deles podem ser aqui destacadas:

    1.      Scotus era um detentor da teoria do conhecimento associada a Aristóteles. No início da Idade Média, predominava uma outra teoria do conhecimento, que remontava a Agostinho de Hipona, conhecida como “iluminismo”, de acordo com a qual se entendia que o conhecimento surgia da iluminação da mente humana por Deus. Essa visão, defendida por escritores como Henrique de Ghent, foi submetida a críticas devastadoras por Scotus.

     2.      Scotus considerava que a vontade divina tem primazia sobre o intelecto divino, uma doutrina comumente chamada de voluntarismo. Tomás de Aquino havia defendido a primazia do intelecto divino; Scotus abriu caminho a novas abordagens teológicas, partindo do pressuposto da prioridade da vontade divina. Um exemplo ilustra bem esse caso. Considera a ideia do mérito – isto é, de uma ação moral do ser humano, considerada digna de ser recompensada por Deus. Qual é o fundamento dessa decisão? Aquino alegava que o intelecto divino reconhecia o valor inerente do ato moral praticado pelo ser humano. Isso instruía a vontade, para que o recompensasse de forma adequada. A argumentação de Scotus seguia uma linha bastante distinta. A vontade divina de recompensar o ato moral precedia qualquer avaliação de seu valor intrínseco. Essa abordagem possui importância considerável em relação às doutrinas da justificação e da predestinação.

     3.      Scotus era defensor da doutrina da concepção imaculada de Maria, a mãe de Jesus. Tomás de Aquino havia ensinado que Maria compartilhava da condição pecadora da humanidade. Ela fora maculada pelo pecado (macula, em latim), assim como todos os demais, com exceção de Cristo. Scotus, entretanto, alegava que Cristo, em virtude de sua obra perfeita da redenção, fora capaz de manter Maria livre da mancha do pecado original. Tamanha era a influência de Scotus, que a “proposição imaculada” (do latim imácula, “livre do pecado”) tornou-se predominante até o final da Idade Média.

Guilherme de Occam (c. 1285 – 1347)

Guilherme de Occam, sob vários aspectos pode ser considerado como tenho desenvolvido algumas das linhas da argumentação associadas à Scotus. Sua defesa consistente da posição voluntarista, que estabelecia a primazia da vontade em relação ao intelecto divino, é de particular importância. No entanto, provavelmente seja sua posição filosófica que tenha lhe assegurado um permanente lugar de destaque na história da teologia cristã. Podemos destacar dois importantes elementos de seus ensinamentos:

    1. A Navalha de Guilherme de Occam, comumente designada como “o princípio da frugalidade”. Occam insistia que a simplicidade era uma virtude ao mesmo tempo teológica e filosófica. Sua “navalha” eliminava todas as hipóteses que não fossem absolutamente essenciais. Isso teve enormes implicações para sua teologia da justificação. Teólogos medievais anteriores (inclusive Tomás de Aquino) haviam alegado que Deus era levado a perdoar a humanidade pecadora por meio daquilo que era chamado um “ambiente de graça” – em outras palavras, algo sobrenatural e intermediário que Deus infundia na alma do ser humano, o qual permitia que o pecador fosse absolvido. Occam descartou essa noção como algo desnecessário e irrelevante, declarando que a justificação consistia na direta aceitação de um pecador por Deus. Não havia qualquer necessidade desse passo intermediário para a aceitação de um indivíduo por Deus. Aquilo que Tomás de Aquino alegava dar-se por meio de uma substância intermediária, Guilherme Occam declarava que ocorria de forma direta, sem qualquer intermediação de algo como um “ambiente de graça”. Assim, estava aberto o caminho para abordagens mais pessoais da justificação, como aquelas associadas à Reforma.

     2.      Guilherme de Occam era um defensor ferrenho do nominalismo. Em parte, isso resultava de seu uso da navalha: os universais foram declarados como hipóteses totalmente desnecessárias que foram, portanto, eliminadas. O crescente impacto do “caminho moderno” na Europa Ocidental muito deve a ele. Um aspecto de seu pensamento que se mostrou de importância singular é a “dialética entre os dois poderes de Deus”. Esse instrumento permitiu que Guilherme de Occam estabelecesse um contraste entre a forma como as coisas efetivamente são e a foram como poderiam ter sido. Uma discussão completa desse aspecto é feita mais adiante; para o momento, basta destacar que Guilherme de Occam teve uma contribuição decisiva em relação às discussões sobre a onipotência de Deus, as quais continuam a ser relevantes nos dias de hoje.

Erasmo de Roterdã (c. 1469 – 1536)

Desidério Erasmo é geralmente considerado como o mais importante escritor humanista do Renascimento, tendo tido, na primeira parte do século XVI, um profundo impacto na teologia cristã. Embora não fosse protestante, em nenhum sentido do termo, muito fez em prol do estabelecimento dos alicerces intelectuais da Reforma, sobretudo por meio de sua vasta produção editorial, na qual se inclui a produção do primeiro texto impresso do Novo Testamento no grego. Sua obra Enchiridion militis christiani [Manual do soldado cristão] foi um marco na área da publicação da literatura religiosa. Embora o livro tenha sido publicado pela primeira vez em 1503 e reeditado em 1509, seu verdadeiro impacto data de sua terceira reedição, em 1515. A partir dessa edição, o livro se tornou uma obra cult, passando ao que parece por vinte e três edições nos sei anos posteriores. Seu apelo era voltado aos leigos escolarizados, a quem Erasmo considerava como o recurso mais importante da igreja. Sua incrível popularidade, nos anos posteriores a 1515, torna possível sugerir que essa obra provocou uma alteração radical na percepção de que os rumores reformistas, em Zurique e Wittenberg, aconteceram pouco depois de Enchiridion haver se tornado um sucesso de vendas.
O manual desenvolvia a tese, revolucionária e altamente atrativa, de que a igreja da época poderia ser reformada mediante um retorno coletivo aos escritos dos patriarcas e da Bíblia. A leitura habitual das Escrituras é apresentada como a chave para uma nova religiosidade leiga, fundamentada na qual a igreja pode ser renovada e reformada. Erasmo concebeu essa obra como um guia para as Escrituras, voltado para os leigos, fornecendo uma exposição simples, porém, culta, a respeito da “filosofia de Cristo”. Essa “filosofia” é, de fato, um tipo de ética prática, em vez de uma filosofia acadêmica. O Novo Testamento diz respeito ao conhecimento do bem e do mal, com a finalidade de que seus leitores possam evitar o último e amar o primeiro. O Novo Testamento é a lex Christi, “a lei de Cristo”, a qual todos os cristãos são chamados a obedecer. Cristo é o modelo a quem os cristãos devem imitar. Contudo, Erasmo não via fé cristã com uma mera observância exterior de um código moral. Sua ênfase tipicamente humanista sobre a religião interior leva-o a sugerir que a leitura das Escrituras transforma seus leitores, dando-lhes uma nova motivação para amar a Deus e ao próximo.
Várias características desse livro possuem uma importância especial. Primeiro, Erasmo entende que a vitalidade futura do cristianismo se encontra nos leigos, não, no clero. O clero é visto no papel de educador, cuja função é possibilitar que os leigos alcancem o mesmo nível de entendimento alcançados pelo clero. Não há lugar para quaisquer superstições que possam dar ao lcero um status permanentemente superior ao das funções leigas. Segundo, a forte ênfase de Erasmo em relação à “religião interior” resulta em uma compreensão do cristianismo, que não faz qualquer referência à igreja – a seus ritos, a seus sacerdotes ou a suas instituições. “Por que se dar ao trabalho de confessar seus pecados a outro ser humano” – pergunta Erasmo – “apenas pelo fato de ser um sacerdote, quando pode confessá-los diretamente a Deus?”.
Erasmo, além dessas sugestões radicais, desenvolveu extensos projetos acadêmicos. Dois deles apresentam uma relevância específica para o avanço da teologia cristã:

      1.      A produção do primeiro Novo Testamento no grego. Como foi destacado anteriormente, esse fato permitiu que os teólogos tivessem um acesso direto ao texto original do Novo Testamento, o que provocou resultados explosivos.

     2.      A produção de edições confiáveis das obras patrísticas, inclusive dos escritos de Agostinho de Hipona. Assim, os teólogos tiveram acesso aos textos integrais dessas grandes obras, em vez de só contar com citações de segunda mão, conhecidas como “sentenças”, frequentemente descontextualizadas. Em consequência disso, uma nova compreensão da teologia de Agostinho de Hipona começou a se desenvolver, trazendo consequências significativas para o avanço teológico do período.
Processos cruciais da teologia

No período analisado, o grande renascimento que ocorreu na teologia concentrava-se em torno de uma série de questões, dentre elas as seguintes são particularmente relevantes. Neste ponto, elas serão apenas destacadas brevemente. Os seis primeiros avanços são associados ao escolasticismo, os dois últimos ao humanismo.

A consolidação do legado patrístico

Quando a Idade das Trevas chegou ao fim, a tendência entre os teólogos cristãos era de começar do ponto em que os escritores patrísticos haviam parado. Pelo fato de a língua falada pela igreja ocidental ser o latim, era natural que seus teólogos se voltassem para a vasta coleção das obras de Agostinho de Hipona e as tomassem como ponto de partida para suas investigações teológicas. A obra de Pedro Lombardo, Sentences [Sentenças], pode ser considerada como compilação crítica de citações (as “Sentenças”), em grande parte extraídas dos escritos de Agostinho de Hipona, sobre os quais esperava-se que os teólogos medievais fizessem comentários.

A exploração do papel da razão na teologia

A nova preocupação em estabelecer a teologia cristã sobre um alicerce totalmente confiável levou à deliberada exploração do papel da razão na teologia, uma característica central e distintiva do escolasticismo. À medida que avançava o renascimento do início da Idade Média, dois temas passaram a dominar o debate teológico: a necessidade de sistematização e expansão da teologia cristã e a necessidade de demonstração da inerente racionalidade dessa teologia. Embora a maior parte da teologia medieval primitiva não passasse de uma repetição das ideias de Agostinho de Hipona, havia uma crescente pressão no sentido de sistematiza-las e de expandi-las. Porém, como se poderia fazer isso? Havia uma crescente pressão no sentido de necessidade premente de se criar uma “teoria do método”. Fundamentado em qual sistema filosófico poder-se-ia demonstrar a racionalidade da teologia cristã?
O escritor Anselmo de Cantuária, no século XI, deu corpo a essa crença fundamental da racionalidade da fé cristã por meio de duas frases que passaram a ser e ligada ao seu nome: fides quaerens intellectum (“a fé em busca do conhecimento”) e credo ut intellegam (“creio que possa conhecer”). Ele basicamente percebeu que, ainda que a fé fosse anterior ao conhecimento, seu conteúdo era, todavia, racional. Essas fórmulas decisivas estabeleciam a prioridade da fé sobre a razão, assim como afirmavam a plena racionalidade da fé. Anselmo, no prefácio de seu livro Monologium, declarou abertamente que nada demonstraria em relação às Escrituras que fosse baseado somente nas próprias Escrituras; em vez disso, ele demonstraria tudo o que pudesse fundamentado na “evidência racional e à luz natural da verdade”. Mesmo Anselmo não sendo um adepto do racionalismo, a razão tem limites!
O século XI e o início do século XII assistiram a uma convicção progressiva de que a filosofia poderia ser um valioso recurso para a teologia cristã em dois níveis distintos. Em primeiro lugar, ela poderia demonstrar a racionalidade da fé e, assim, defendê-la frente aos seus críticos não-cristãos. Em segundo lugar, ela proporcionava maneiras de investigar e de organizar sistematicamente os artigos de fé, de forma que pudessem ser mais bem compreendidos. Porém, que filosofia seria essa? A resposta veio por intermédio da redescoberta dos escritos de Aristóteles, no final do século XII. Aristóteles, por volta de 1270, era conhecido como “O Filósofo”. Suas ideias passaram a dominar o pensamento teológico, apesar da ferrenha oposição de parte de setores mais conservadores.
As ideias de Aristóteles, por intermédio da influência dos escritores como Tomás de Aquino e Duns Scotus, firmaram-se como o melhor meio de consolidação e desenvolvimento da teologia cristã. As ideias da teologia cristã foram, assim, organizadas e inter-relacionadas de forma sistemática, fundamentadas nos pressupostos aristotélicos. A racionalidade da fé cristã foi igualmente demonstrada fundamentada nas ideias de Aristóteles. Portanto, algumas das famosas “provas” da existência de Deus apresentadas por Tomás de Aquino baseiam-se, na verdade, em princípios da física aristotelina, em vez de critérios distintamente cristãos.
A princípio, esse desenvolvimento foi bem recebido por muitos que o viam como um recurso capaz de proporcionar importantes meios de defesa da racionalidade da fé cristã – uma disciplina que, depois, passou a ser conhecida como “apologética”, derivada da palavra grega apologia (defesa). A obra de Tomás de Aquino, Summa contra gentiles, é um excelente exemplo de uma obra teológica que emprega o aristotelianismo como uma filosofia comum, compartilhada por cristãos e muçulmanos, que permitiria à fé cristã ser explicada de forma atrativa em meio do mundo islâmico. Em certos momentos, o argumento de Tomás de Aquino parece funcionar no seguinte sentido: se você é capaz de concordar com as ideias de Aristóteles, expostas nessa obra, então você deve se tornar um cristão. Como Aristóteles gozava de alta reputação em meio a muitos acadêmicos muçulmanos do período, essa atitude de Tomás de Aquino pode ser encarada como uma forma de exploração do potencial apologético daquele filósofo. Essa inovação passou a ser objeto de preocupação, por parte de alguns escritores medievais posteriores, como Hugolino de Orvieto. De acordo com esses críticos, uma série de critérios cruciais da fé cristã parecia haver sido deixada de lado, em consequência da crescente dependência em relação às ideias e métodos de um filósofo pagão. Particular receio se concentrava em torno da doutrina da justificação, em relação à qual as ideias éticas de Aristóteles vieram a desempenhar um papel significativo. A noção da “justiça de Deus” passou a ser discutida segundo o conceito aristoteliano de “justiça distributiva”. Aqui, o conceito de “justiça” (iustitia) foi definido em termos de “dar a cada um o que é de direito”. Isso parecia conduzir a uma doutrina da justificação pelo mérito. Em outras palavras, a justificação se dava fundamentado no direito de cada um, em vez da graça. Percebe-se facilmente que essa preocupação estava por trás da crescente animosidade de Martinho Lutero em relação a Aristóteles, bem como de seu futuro rompimento com as doutrinas escolásticas sobre a justificação.

O desenvolvimento da teologia dos sacramentos

A igreja primitiva havia sido relativamente vaga em relação à discussão dos sacramentos. Havia pouco consenso, tanto em relação à definição de “sacramento” como os itens que deveriam ser incluídos na lista de sacramentos. Havia consenso geral em relação ao batismo e à eucaristia; infelizmente, havia pouco consenso com referência ao resto. Entretanto, a igreja, com o renascimento teológico da Idade Média, passaria a desempenhar um papel cada vez mais importante na sociedade. Havia uma nova pressão para que a igreja amparasse seus atos litúrgicos em bases intelectuais sólidas, consolidando os aspectos teóricos do culto religioso. Em consequência, a teologia dos sacramentos apresentou um avanço significativo ao longo desse período. Chegou-se a um consenso com referência à definição do termo sacramento, bem como em relação à quantidade e às características específicas desses sacramentos.

O desenvolvimento da teologia da graça

Um elemento central do legado agostiniano foi o surgimento de uma teologia em relação à graça. Entretanto, a teologia da graça desenvolvida por Agostinho de Hipona havia sido apresentada em um contexto polêmico. Agostinho de Hipona, em outras palavras, havia sido obrigado a elaborar sua teologia da graça no calor dos debates, frequentemente em resposta aos desafios e às provocações de seus adversários.
Disso resultou o fato de que seus escritos sobre esse tema normalmente não eram sistematizados. Agostinho de Hipona, ocasionalmente, estabelecia certas diferenciações em resposta às necessidades do momento, havendo falhado em relação ao desenvolvimento de uma base teológica adequada para, no mínimo, algumas delas. Os teólogos da Idade Média consideravam-se encarregados da tarefa de consolidar a doutrina da graça que fora criada por Agostinho de Hipona, amparando-a em bases mais sólidas e explorando suas consequências. Em consequência disso, as doutrinas da graça e da justificação evoluíram consideravelmente nesse período, fixando as bases para os debates da Reforma em torno desses temas centrais.

O papel de Maria no plano da Salvação

O interesse inédito pelas questões da graça e da justificação levou a uma nova preocupação em relação à compreensão do papel de Maria, a mãe de Jesus Cristo, no plano da salvação. Um crescente interesse na devoção a Maria, vinculado a uma intensa reflexão teológica com referência à natureza do pecado original e da redenção, levou a mariologia (isto é, a área da teologia que trata do papel de Maria) sobre uma base mais consistente de que até o momento, está associado a muitas delas. Surgiu um intenso debate entre os “maculatistas” (defensores da tese de que Maria estava sujeita ao pecado original, como todos os demais seres humanos) e os “imaculatistas” (defensores da tese de que ela havia sida preservada da mácula do pecado original). Havia também uma grande polêmica em relação ao fato de ser ou não admissível dizer que Maria era “co-redentora” (isto é, se ela devia ou não ser considerada como um agente da redenção, assim como Jesus Cristo).

Retorno imediato às fontes da teologia cristã

Um elemento central do programa humanista era um retorno às clássicas fontes greco-romanas, o germe da cultura europeia ocidental. O equivalente teológico desse elemento era o retorno direto às fontes primitivas da teologia cristã, sobretudo em relação ao Novo Testamento. Esse projeto mostrou-se de extrema importância, como será posteriormente analisado. Uma de suas consequências mais significativas foi à valorização da importância fundamental das Escrituras como instrumento teológico. A medida que aumentava o interesse pelas Escrituras, tornava-se mais evidente a inadequação das versões latinas, existentes naquele período, das Escrituras. A principal delas era a “Vulgata”, versão latina da Bíblia que havia alcançado uma ampla aceitação ao longo da Idade Média. Conforme as traduções eram revisadas, especialmente a Vulgata, tornou-se evidente o fato de que uma revisão teológica era inevitável. Alguns ensinamentos pareciam estar baseados em traduções incorretas. O surgimento das técnicas textuais e filosóficas do humanismo viria a expor as lastimáveis discrepâncias entre a Vulgata e os textos que se pretendera traduzir – abrindo, em consequência, o caminho para a reforma doutrinária. É por esse motivo que o humanismo possui uma importância decisiva para o desenvolvimento da teologia medieval: por haver demonstrado a falibilidade da Vulgata – e, consequentemente, ao que parecia das teologias que nela se baseavam. A base bíblica do escolasticismo parecia estar reunindo à medida que o humanismo descobria um erro após o outro na tradução da Vulgata. A seguir, exploraremos ainda mais essa questão, pois, indubitavelmente, representa um dos avanços mais significativos na história da teologia cristã daquela época.

A crítica à Vulgata

O projeto literário e cultural do humanismo pode ser sintetizado no lema ad fontes – “voltar às fontes originais”. O “filtro” representado pelos comentários medievais – quer em relação aos textos legais quer à Bíblia – foi posto de lado com a finalidade de que os humanistas pudessem se envolver diretamente com os textos originais. Aplicado à igreja cristã, o lema ad fontes representava um retorno direto às obras-mestras do cristianismo – aos autores patrísticos e, sobretudo, a Bíblia, estudada em línguas de origem. Isso exigia um acesso direto ao texto do Novo Testamento no grego.
A primeira edição grega do Novo Testamento foi produzida por Erasmo, em 1516. O texto de Erasmo não era tão confiável como deveria: ele tivera acesso somente a quatro manuscritos para a maior parte do Novo Testamento, bem como apenas um manuscrito para sua parte final, o livro do Apocalipse. Por coincidência, o manuscrito deixava de fora cinco versículos, os quais tiveram de ser traduzidos para o grego pelo próprio Erasmo, a partir da versão latina da Vulgata. Entretanto, essa edição foi um marco literário. Pela primeira vez, os teólogos tinham a chance de comprar o texto original do Novo Testamento, em grego, com sua versão Vulgata, posterior, em latim.
Erasmo, baseando-se em estudos anteriormente feitos pelo humanista italiano, Lorenzo Valla, demonstrou que a tradução registrada na Vulgata de vários textos importantes do Novo Testamento não se justificava. Como uma série de práticas e crenças da igreja medieval eram fundamentadas nesses textos, as alegações de Erasmo foram vistas com receio e alarme por muitos católicos conservadores (os quais desejavam a manutenção dessas práticas e crenças) e, na mesma proporção, com um enorme prazer pelos reformadores (os quais desejavam eliminá-las). Três exemplos clássicos dos erros encontrados na Vulgata demostrarão a relevância dos estudos bíblicos realizados por Erasmo:

     1.      Grande parte da teologia medieval justificava a inclusão do matrimônio na lista de  sacramentos, tomando por base um texto do Novo Testamento que – pelo menos, na versão Vulgata – falava do casamento como um sacramentum (Ef 5:31,32). Erasmo destacou que a palavra grega (mysterion), traduzida como “sacramento”, significava simplesmente como “mistério”. Não havia qualquer referência ao fato do matrimônio ser um sacramento. Um dos textos clássicos, usados pelos teólogos medievais para justificar a inclusão do matrimônio na lista de sacramentos, tornou-se, dessa forma, praticamente imprestável.

     2.      A Vulgata traduziu as palavras abertas do ministério de Jesus (Mt 4:17) como “penitenciem-se, porque está próximo o Reino dos Céus”. Essa tradução sugeria a existência de uma direta correlação entre a vinda do Reino dos Céus e o sacramento da penitência. Erasmo, mais uma vez, baseando-se em Valla, advertiu que o texto grego deveria ser traduzido como “arrependam-se, porque está próximo o Reino dos Céus”. Em outras palavras, enquanto a Vulgata parecia referir-se à prática exterior (o sacramento da penitência), Erasmo insiste que a referência era em relação à atitude psicológica interior do indivíduo – a atitude de “estar arrependido”. Uma vez mais, era desafiada uma justificativa relevante do sistema sacramental adotado pela igreja medieval.

      3.      De acordo com a Vulgata, o anjo saudou Maria como “aquela que é cheia de graça” (gratia plena) (Lc 1:28), sugerindo, dessa maneira, a imagem de um reservatório cheio de graça, que poderia ser invocado sempre que necessário. Contudo, como Erasmo advertiu, o texto grego original simplesmente queria dizer “a favorita” ou “aquela que encontrou graça”. Maria era alguém que havia encontrado graça diante de Deus e não, necessariamente, alguém que poderia conceber graça aos outros.

Essas descobertas diminuíram a credibilidade atribuída à versão Vulgata e abriram caminho para uma revisão teológica, fundamentada em um melhor entendimento do texto bíblico. Também demonstrou a importância do academiscismo bíblico em relação à teologia. Não se poderia admitir que a teologia estivesse fundamentada em erros de tradução! Dessa maneira, a partir da segunda década do século XVI, foi reconhecida a vital importância dos estudos acadêmicos da Bíblia para a teologia cristã. Isso também levou às inquietação teológicas da Reforma.
Agora, nossa atenção volta-se para o fascinante tema da teologia bizantina, que floresceu na Europa Oriental ao longo da Idade Média. Embora uma questão de espaço impeça uma discussão detalhada acerca de seus temas e teólogos principais, analisaremos algumas de suas características mais relevantes.

A teologia bizantina

A teologia bizantina recebe esse nome por causa da cidade grega de Bizâncio, escolhida por Constantino como local de sua nova capital, em 330, quando seu nome foi mudado para Constantinopla (“cidade de Constantino”). Contudo, o antigo nome prevaleceu e deu nome ao estilo teológico característico, que floresceu nessa região até a queda de Constantinopla, em 1453, pela invasão de islâmicos. Deve-se destacar que Constantinopla não era o único centro do pensamento cristão no Mediterrâneo Oriental. O Egito e a Síria haviam sido, por um certo período, centros de reflexão teológica. Entretanto, à medida que aumentava a concentração do poder político em torno da cidade imperial também crescia, na mesma proporção, seu status como centro teológico. No período de Justiniano (527-56), a teologia bizantina começou a despontar como uma força intelectual de grande importância. À medida que as igrejas do oriente e do ocidente progressivamente se afastavam uma da outra (um processo que havia começado muito antes do cisma final, em 1054), os intelectuais bizantinos, por seu lado, frequentemente enfatizavam as divergências da teologia ocidental (por exemplo, com relação à cláusula filioque), reforçando assim a diferenciação de sua abordagem por intermédio de escritos polêmicos. Os teólogos bizantinos, por exemplo, tinham a tendência de entender a salvação principalmente no sentido de divinização, em vez de recorrer às categorias legais e relacionais do ocidente. Além disso, ficavam perplexos com as doutrinas do purgatório, que ganhavam força nos círculos católicos ocidentais. Portanto, ao longo da Idade Média, qualquer tentativa de chegar a um consenso entre o ocidente e o oriente era dificultada por uma complexa rede de fatores de ordem política, histórica e teológica. Até período da queda de Constantinopla, as diferenças entre oriente e ocidente permaneciam maiores do que nunca.
Com a queda de Bizâncio, as lideranças intelectuais e políticas da igreja ortodoxa transferiram-se para a Rússia. Os russos, no século X, haviam se convertido por meio da obra de missões bizantinas tomando o partido dos gregos, no cisma de 1054. Moscou e Kiev, até o final do século XV, haviam se estabelecido como sólidos patriarcados, cada um deles com seu estilo característico de teologia ortodoxa.
Para se compreender a natureza peculiar da teologia bizantina é necessário considerar seu caráter. Os teólogos bizantinos não estavam particularmente interessados em sistematizar a fé cristã. Conforme sua ótica, a teologia cristã era algo que lhes fora “dado” e que, portanto, precisa ser defendido de adversários e explicado a seus adeptos. A noção de “teologia sistemática” era um tento estranha ao caráter geral bizantino. Mesmo João de Damasco (c. 675 – c. 749), cuja obra de fide orthodoxa [De fé ortodoxa], de grande importância na consolidação de uma teologia cristã distintamente oriental, é visto como um defensor da fé, em vez de um intelectual teórico ou criativo.
Pode-se considerar que a teologia bizantina permaneceu fiel a um princípio originalmente criado por Atanásio, em sua obra de incarnatione [Da encarnação], que afirmava que a teologia era a expressão da mente dos santos. Assim, a teologia bizantina (inclusive suas gerações atuais, tanto da igreja ortodoxa grega quanto da russa) é fortemente orientada no sentido da noção de paradosis (“tradição”), em especial os escritos dos patriarcas gregos. Escritores como Gregório de Nissa, Máximo, o Confessor, e o autor que adotou o pseudônimo de “Dionísio, o areopagita” têm importância especial nesse aspecto.
Duas controvérsias são particularmente importantes. A primeira delas, que surgiu no período de 725-842, é normalmente conhecida como controvérsia iconoclasta (“destruição de imagens”). Ela se originou em razão de uma decisão do imperador Leão III (717-42) de destruir as imagens sagradas, fundamentada no argumento de que elas eram obstáculos à conversão dos judeus e muçulmanos. A controvérsia era, sobretudo, de cunho político, embora houvesse algumas questões teológicas sérias em jogo, principalmente a discussão sobre até que ponto a doutrina da encarnação justificava a representação de Deus em forma de imagens.
A segunda controvérsia, que teve início no século quatorze, concentrava-se na questão do hesicasmo (do grego: heyschia = silêncio), um estilo de meditação por meio dos exercícios físicos, que capacitava seus fiéis a ver a “luz divina” com os próprios olhos. O hesicasmo enfatizava grandemente a ideia de “paz interior” como meio de alcançar uma visão interior imediata de Deus. Esse método era particularmente associado a escritores como Simeão, o novo teólogo, e Gregório Palamas (c. 1296 – 1359), que foi eleito Arcebispo de Tessalônica, em 1347. Seus opositores alegavam que seus métodos tendiam a minimizar a diferença que existia entre Deus e as criaturas e eram particularmente alarmantes por sugerir que Deus poderia ser “visto”.
Palamas, em resposta às críticas, desenvolveu a doutrina hoje geralmente conhecida como “palamismo”, que trata um distinção entre as energias divinas e a essência divina. A distinção permitiu que Palamas defendesse a abordagem hesicástica, por meio da afirmação de que a mesma capacitava os fiéis a encontrar as divinas energias, mas não, a invisível e inefável essência divina. Os fiéis não podem participar diretamente da divina essência; entretanto, são capazes de participar diretamente das energias não criadas, que são a forma por meio da qual Deus se une a seus fiéis. A teologia de Palamas foi particularmente adotada e desenvolvida pelo teólogo leigo Nicolas Cabasilis (c. 1320 – c. 1390), cuja obra Life in Christ [Vida em Cristo] permanece um clássico da espiritualidade bizantina. Sua obra foi retomada mais recentemente por escritores neopalamitas, como Vladimir Lossky e John Meyendorff.

Ficará evidente, a partir do material apresentado neste capítulo, que a teologia cristã, tanto oriental quanto ocidental, experimentou avanços significativos ao longo da Idade Média e do Renascimento. As posteriores gerações de teólogos consideram o período como um marco significativo em relação a uma série de áreas de reflexão teológica, sendo atribuída importância contínua a vários dos autores desse período. A ascensão e queda de Bizâncio são de particular importância para a plena compreensão do desenvolvimento posterior da igreja ortodoxa na Rússia e na Grécia, da mesma forma que o surgimento do escolasticismo e do humanismo foram de grande importância para a formação da teologia ocidental.

Fonte: teologia sitemática Alister McGrath

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